O Governo e as cobranças do Centrão

Pouco depois de assumir o comando do legislativo nacional, o Centrão já manda parte da fatura ao Palácio do Planalto. Por sua vez, o Governo prepara reformas e deve se entregar de modo singular ao fisiologismo que já o marca. Bolsonaro volta para casa e já pode, novamente, ser chamado de garoto-centrão.




Colunas, Paulo Junior
Bolsonaro com mão apoiada no nariz. Sembante de preocupado.

Semana passada esta coluna abordou alguns dos pontos que poderiam ser traumáticos ao governo Bolsonaro, caso a aliança com o Centrão resultasse na eleição dos novos chefes do legislativo brasileiro. A aliança foi vencedora. A Câmara agora está sob o comando de Arthur Lira (PP-AL), líder do bloco fisiológico, já o Senado passou a contar com Rodrigo Pacheco (DEM-MG). No momento atual, parte da conta já é entregue e cobrada junto ao Palácio do Planalto, Bolsonaro, ao que tudo indica, prometeu demais e, talvez, não consiga entregar.

Certamente que se trataram de vitórias consideráveis e importantes, a derrota de Rodrigo Maia (DEM-RJ) na Câmara obriga que diversas peças do jogo político se reorganizem. Além de oxigenar o fadado Governo Bolsonaro. O mandatário maior da nação entregou-se de modo derradeiro, e público, aos seus métodos de fazer política. Fisiologista deste sempre, Bolsonaro voltou para casa na tentativa de manter-se vivo no xadrez de Brasília.

A volta para casa não foi inteiramente comemorada, a equipe econômica do governo, apesar de parecer alinhada com o novo chefe da pauta de votações, Arthur Lira, mantém alguns vários cuidados. Cuidados necessários, pois a pauta estará ao prazer das necessidades do Centrão.

É incrível como o fazer bolsonarista é incapaz de evoluir, Bolsonaro, eterno garoto-centrão, esqueceu que uma das práticas do fisiologismo é compromisso consigo e não com o outro. O Centrão sabe de seus desejos e das promessas feitas a luz do dia. Portanto, a lua de mel entre o Planalto e o Congresso pode durar pouco ou, em uma situação exótica, sequer começar.

Bolsonaro já prepara uma reforma ministerial, provavelmente será feita aos poucos, a fim de construir um discurso de renovação, de atualização necessária. No entanto, concretamente, é preciso indicar que os partidos do bloco fisiológico não estarão eternamente em banho maria. Logo, as mudanças não virão ao tempo do Governo, mas ao tempo do bloco. Especula-se, inclusive, que alguns ministérios possam ser recriados para garantir a acomodação da extensa lista de compromissos firmados.

Uma dessas novas pastas poderá reduzir, o já minguado, poder de Paulo Guedes. Bolsonaro tem avaliado junto aos seus auxiliares a recriação do Ministério do Planejamento, hoje sob a tutela do super Ministério da Economia. Ou seja, o Governo precisará se esvaziar ainda mais se quiser manter-se relevante ao contexto político do dia. O trágico desse prólogo é que ao tentar viver, talvez, o Governo esteja pavimentando o caminho de seu fim.

Confrontados com o cotidiano das casas legislativas, com a baixa popularidade bolsonarista, com ausência de ações coerentes ao combate da pandemia; o Centrão pode em pouco tempo desembarcar do navio governista. A narrativa de hoje ainda dá conta de um grupo que acredita no renascimento de Bolsonaro e na construção de pontes firmes para sua reeleição. Entretanto, a realidade vem conjugando observações menos benfazejas ao governismo. Em queda nas pesquisas de intenção de votos e aprovação, Bolsonaro age não para buscar a reeleição, mas garantir que ao menos possa concluir o mandato.

Ele já declarou que acorda chorando em algumas noites, disse só há problemas e que teve a vida virada. Ao lado do Centrão, os prantos tendem a ser mais frequentes e as cobranças mais ardorosas, e não serão gritos envaidecidos de uma sanha autoritária que os irão impedir. Bolsonaro brinca com fogo, sabendo que provavelmente irá se queimar.

A distribuição de emendas parlamentares foi apenas a primeira de muitas parcelas que estão por vir. Em janeiro o Governo liberou um volume recorde de recursos para os deputados, e senadores, usassem em suas bases eleitoras, foram mais de R$504 milhões. Porém, após a eleição, a nova base bolsonarista quer mais, já pressiona pelo comando da Casa da Moeda e do Banco do Brasil.

Enquanto isso, o mesmo Centrão julga-se capaz de questionar o trabalho e os procedimentos da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) no processo de liberação para uso emergencial de vacinas no país. Há uma histeria instaurada em Brasília. Nesta histeria todos dominam a pauta da saúde, sentem-se aptos e definir questões de interesse nacional. Talvez seja por isso que o fisiologismo também almeja as pastas da ala militar, incluindo a saúde.

As mudanças serão profundas. Bolsonaro, ao tentar evitar o processo de impeachment, pode estar sendo neutralizado, perdendo o grão final de comando que lhe havia em mãos. Porém, isso não significa o fim de suas práticas, porque como afirmado no início, Bolsonaro é garoto-centrão. Logo, sempre emulou os métodos de sua trupe, ora de modo escancarado, ora nos bastidores do Alvorada. A maior diferença é que a partir de agora ele agirá como rei encastelado, desviando enquanto puder para não levar um xeque mate.

No atual barco do Governo, o capitão tende mandar pouco. Porque enquanto o Centrão estiver ancorado, seu cargo tende a ser decorativo. No dia do divórcio, pois ele virá, restará ver se o presidente terá melhorando a sua posição no tabuleiro, porque o Centrão deixa os seus peões à mostra.