Roberto Jefferson é filho do bolsonarismo

Apoiador antigo de Jair Bolsonaro (PL), Roberto Jefferson atirou contra policiais que cumpriam um mandado de prisão contra ele. Ex-deputado federal, o político escancara -novamente – a rinha pública que o bolsonarismo transformou o país.




Colunas, Paulo Junior

Havia ainda quem se perguntasse qual limite do bolsonarismo. Bem, depois do fato ocorrido nesse domingo,23, uma coisa fica em tom mais que luminar: não há limites. A reação despropositada do ex-deputado Roberto Jefferson (PTB) no ato de cumprimento de sua prisão ultrapassa o campo da surrealidade. Jefferson recebeu policiais federais com tiros e granadas. Ele fez isso ancorando-se em um ideário pautado por um falso moralismo, contexto que permeia parte significativa do movimento bolsonarista.

Roberto Jefferson havia sido preso em 2021, no âmbito da apuração das milicias digitais e atos antidemocráticos. Alguns meses depois, alegando motivos de saúde, o ex-parlamentar conseguiu   progredir para prisão domiciliar. Porém, a progressão estava condicionada ao uso de tornozeleira eletrônica, não recebimento de visitas, além da natural proibição de manter armas de fogo em seu domínio. Jefferson descumpriu todas essas medidas, e nesse fim de semana ainda divulgou vídeos com ataques misóginos contra a ministra do STF, Carmem Lúcia.

O mandado de prisão do político foi expedito e deveria ter sido executado na manhã de ontem, 23. No entanto, como relato há pouco, os agentes da Polícia Federal foram recepcionados com disparos e granadas. A cena que lembra os filmes de hollywood não é ficção, trata-se de um retrato da triste realidade brasileira. Jefferson sentiu-se livre para atirar. Ele sentiu-se livre para matar.

Nessa linha, é fundamental pontuar desde agora que o protagonista dos atos desse domingo, que resultaram em dois policiais feridos, é um filho direto do bolsonarismo mais reacionário. Roberto Jefferson reencontra os holofotes da política na gestão Bolsonaro (PL), e apesar de o presidente negar a proximidade, as fotos que se espalham pelas trilhas da internet são a prova disso. Comandando o PTB há décadas, Roberto Jefferson esteve nos últimos anos como um aliado de primeira hora de Bolsonaro, sendo a voz mais extremada aos discursos de ódio proferidos repetidamente pelo ocupante do Planalto Central.

Depois do ocorrido, o presidente veio a público, afirmou repudiar os atos praticados pelo companheiro. Todavia, não faz sentido repudiar aquilo que encontra nascedouro singular em seu leito. Jefferson é filho do bolsonarismo que enxerga o país segundo uma lente distorcida e hedionda. O ódio que eles afirmam temer é seguidamente por eles praticado, o cerceamento dito é corriqueiramente espraiado. O esvaziamento do espaço público é continuamente praticado. Jefferson é filho de um ambiente político que faz questão de negar a política, e que trata o campo da democracia como um espaço de menor valor.

Líder de ações que atentam contra o Estado Democrático de Direto, o comandante do PTB evidenciou de modo drástico o risco que espaço da democracia corre. A reação dele é a reação da apolítica, do negacionismo barato. Reação de quem é incapaz de notar a diminuição de poder e lidar com o peso dos atos exercidos. Condenado, Roberto Jefferson é a sanha de alguém que tem como tábua de salvação o extremismo, pois é o único lugar em que sua voz ainda poderia encontrar alguma locução. No bolsonarismo houve ressonância.

Gerindo os rumos do PTB há décadas, ele fez um padre fake de candidato. E Padre Kelmon foi a linha auxiliar que Bolsonaro queria. Na indescritível retorica de Kelmon, até Bolsonaro pareceria moderado. E juntos, pintavam um país de conto de fadas, e de soluções fáceis. O PTB tornou-se uma seita, um espaço de conservadorismo arraigado, e que esqueceu aquilo que realmente interessa ao país.

A prisão de Jefferson e sua reação colocam, mais uma vez, em xeque situações como a política armamentista e o discurso bolsonarista de respeito às forças de segurança. Além disso, há um detalhe a ser notado, mesmo repudiando o contexto e negando proximidade com o infrator, o presidente destacou o Ministro da Justiça, Anderson Torres, para que acompanhasse pessoalmente o desenrolar dos fatos.

Em um mundo de conservadorismo extremo, de discursos de ódio reiterados, de armamentismo como resolução para segurança, de negação da política. Em mundo de rasidão reflexiva, de cegamento para realidade, de corrupção institucionalizada. Em mundo bolsonarista, os filhos do movimento sentem-se no direito de atirar e tolher até quem eles disseram um dia defender. Roberto Jefferson é a ponta do iceberg, mas, no oceano do bolsonarismo existem filhos infinitamente piores, e com uma cabeça uma tanto mais irracional.