Prévias tucanas expõem feridas internas, elas estão abertas e é difícil curar

A votação que definiria o candidato tucano ao Palácio do Planalto foi um fracasso. Sem nome definido, as campanhas de Eduardo Leite e João Doria estão em tom elevado, as rachaduras partidárias são profundas e a sigla está entregue ao caos. O passado bolsonarista segue cobrando a fatura.




Colunas, Paulo Junior

Em 2018, o PSDB viu seu pior resultado nas urnas, pouco mais de 4% dos votos válidos. Naquela época, nomes que alçavam voos regionais se aliaram ao bolsonarismo sem nenhuma cerimônia, e no lastro desse alinhamento elegeram-se governadores. Aqui cabe apontar dois em específico, João Doria, em São Paulo, e Eduardo Leite, no Rio Grande do Sul. Três anos após este alinhamento, esses nomes tentam negar Bolsonaro e ser escolhidos como nome do PSDB para disputar a presidência em 2022. Contudo, parece que o envolvimento com o bolsonarismo foi tanto, e tamanho, que o caos peculiar aos núcleos da ala Bolsonaro se instalou no partido.

No meio deste caos, o ninho tucano tentou sem sucesso realizar prévias partidárias no domingo, 21. Porém, a votação interna escancarou em tom gritante as rachaduras que se alastram no tucanato. O aplicativo escolhido para que os filiados registrassem seus votos apresentou instabilidades logo pela manhã, depois deixou de funcionar integralmente, e somente 10% dos filiados aptos a votar conseguiu concretizar o processo. No furacão que se observou, Doria e Leite subiram o tom e as acusações.

O ninho tucano evidenciou nesse domingo que caminha para as sombras em 2022, independente do candidato. A sigla sai arrasada do processo, sem organicidade estrutural e unidade diretiva; olha a festa montada no Centro de Eventos Ulysses Guimarães, em Brasília, se desmontar e ser levada por águas de rios próximos. E ao que parece quem construiu a casa ao lado do rio foi o próprio partido.

A legenda que por anos rivalizou no âmbito nacional com o PT, agora se vê relegada a um lugar menor, não está afeita a esta posição. E na tentativa de voltar ao apogeu, alocou-se ainda mais distante da mesa do jogo. O tucanato está rachado e expõe midiaticamente uma de suas maiores crises, sempre afeito a brigas internas, esta indica ser maior e mais turbulenta que a maioria.

Os ataques e farpas que saem entre Doria e Leite não são mais uma retórica de campanha, abrem espaço para desdobramentos consideráveis após o resultado final, e a observância sobre quem leva a vaga para presidência. Cada lado tem em seu favor nomes importantes da história do partido, Doria está alardeado por José Serra (PSDB-SP), Yeda Crusius (PSDB-RS) e Fernando Henrique Cardoso (PSDB-SP). Já Eduardo Leite tem em seu lastro nomes como Tasso Jereissati (PSDB-CE), José Aníbal (PSDB-SP), além de contar com apoio informal de Geraldo Alckmin (PSDB-SP).

Ou seja, o resultado final mexe com figuras marcantes e influentes na estrutura partidária, assim, a construção de unidade em volta do futuro candidato será difícil e arrastada. Nessa linha, é fundamental pontuar que haverá, sem dúvidas, desfiliações de alguns desses nomes históricos que se envolveram diretamente nas campanhas, e até mesmo do perdedor. Em São Paulo, os tucanos já tem candidato ao governo, trata-se de Rodrigo Garcia, atual vice-governador do estado. No Rio Grande do Sul ainda não há um nome definido, mas Leite disse que não buscará a reeleição.

O PSDB vive pesadelos, Bruno Garcia, presidente da sigla, afirmou que o vencedor das prévias precisará lamber as feridas que estão abertas. Resta ver primeiro se haverá o fim das prévias, ou se outros caminhos serão impostos. Doria quer a retomada da votação no próximo domingo, 28. Leite quer o fim da votação em no máximo 48 horas. O paulista afirma que adiamento daria tempo de adequar o aplicativo de votação, o gaúcho alega que a dilatação do tempo em uma semana reabria a campanha e as pressões sobre os filiados. Doria diz que Eduardo Leite muda de posição a cada dez minutos. Leite afirma que a campanha do governador paulista sente o peso da sua, e que os ataques já eram esperados.

O ninho tucano está atiçado, as aves estão batendo asas e o futuro é demasiadamente incerto.  A legenda está aberta, fragilizada e enfrenta um caos em nível que poucas vezes lhe foi comum. Bruno Araújo, mandatário do partido, e homem experiente na política, afirmou que nunca antes foi tão pressionado, e continuará sendo.

Tucanos estão sem trilha a seguir. Desvalorizados, com menor tempo de TV, menos dinheiro em caixa e mais brigas, os rumos até 2022 tendem a ser mais que tortuosos. O partido que se viu, de certa forma, levado ao baixo escalão em 2018, ao que parece não se recuperará em nível fénix, em 2022. O tucanato está perdido, os candidatos são frágeis, o processo de escolha está sob suspeita, e o passado bolsonarista já bate à porta. Portanto, as feridas abertas já estão em estágio bem avançado de corrosão do corpo que as carrega, agora, se espalham ainda mais.

Por fim, pontua-se que existe um terceiro candidato nas prévias do PSDB, trata-se do ex-prefeito de Manaus, Arthur Virgílio. O político está no jogo tal uma criança que briga com amigos mais velhos. Os mais velhos o deixam brincar, fingem que ele está no jogo, mas sabem que ele não oferece risco, está ali somente para ele se entreter, passar um pouco tempo e deixar a sensação de que jogou. Tal qual dizem no Nordeste, a criança deste exemplo é ‘café com leite’, Artur Virgílio também.