PDT, PEC dos Precatórios e a suspensão da candidatura Ciro Gomes

O largo apoio do PDT a PEC dos precatórios criou uma crise dentro do próprio partido. Ciro Gomes suspendeu a pré-candidatura à presidência, e tenta articular uma revisão de postura para o segundo turno da PEC na Câmara. Em meio a tudo, o partido parece deslocado do que um dia foi.




Colunas, Paulo Junior

Ciro Gomes surpreendeu a todos na última quinta-feira, 04, ao anunciar que iria suspender sua pré-candidatura à presidência da República. O ato ocorreu após o seu partido, o PDT, conceder apoio fundamental para aprovação da PEC dos precatórios, projeto que prevê um calote de dívidas públicas e é considerado essencial para manutenção do governo Bolsonaro. Ciro afirmou que manteria a candidatura em suspenso até que o partido reavaliasse a posição, afim de reverter a aprovação do projeto na votação de segundo turno. Gomes é estrategista, e esta ação pode fazer sua legenda rever o posicionamento, mas se não o fizerem, o político estará em uma situação no mínimo delicada.

 O pedestista estava em plena campanha. Ancorado no marqueteiro João Santana, Ciro Gomes estava elevando o nível de suas peças publicitárias, já tendo disponibilizado até jingle de pré-candidatura, tudo balizado pelo mote: ‘eu prefiro Ciro’. O status de atividade eleitoral, as verborragias proferidas, e o quase irrestrito apoio do PDT a Ciro, fazem de sua decisão uma surpresa. Ele tenta encontrar coesão no próprio discurso, objetivando reduzir as arestas que terá que aparar um pouco mais a frente.

Contudo, é preciso ponderar com atenção, a suspensão da candidatura Ciro Gomes pode de fato ter efeito prático e conduzir a uma revisão de postura pelos parlamentares da sigla, fazendo a PEC encerrar seu caminho no Congresso. Calos Lupi, presidente do PDT, afirmou em entrevista à CNN Brasil que estava ligando para os deputados e conversando individualmente, afim de assegurar uma reorientação da bancada.

O partido de Brizola, porém, encontra-se urgentemente defronte da necessidade de reequilibrar seus caminhos. Pois ao que parece a legenda vive um momento de desordem abissal, ou no mínimo de falta exacerbada de reflexão crítica sobre suas posições. É irreal que uma agremiação com postulante ao Planalto Central seja capaz de simplesmente entregar uma folga fiscal de mais de R$90 bilhões ao desgoverno atual. Esta folga pode ser a constituição de um cheque em branco para o bolsonarismo. E se este cheque se torna palpável, o mesmo bolsonarismo que deturpou a realidade em 2018, agirá na deturpação de 2022.

Nas incongruências pedetistas está o fato de o partido ter massivamente votado a favor da PEC, e no dia seguinte ter ingressado com ação no Supremo Tribunal Federal para cancelar a sessão em que a votação ocorreu. O argumento aplicado pelo partido tem como base a decisão da mesa diretora da Câmara de aceitar votação remota, quando isto já não mais seria possível, havendo a exigência de presença em plenário para registro de posição. O STF ainda não se manifestou sobre a ação do partido.

No meio de tudo isso, há Ciro Gomes, que luta para sair dos 10% de intenção de votos e se firmar como uma terceira via competitiva. Gomes pode observar a sua intervenção de suspenção como um sucesso, caso sua legenda passe a agir contrariamente a aprovação do texto da PEC. Contudo, se o partido mantiver o norte de alinhamento, fica o questionamento de qual atitude será tomada pelo político.

Ciro viu seu partido dar-lhe um golpe bastante duro, tentou reagir à altura e foi acolhido por nomes importantes do Congresso, como senador Randolfe Rodrigues (REDE-AP). Agora resta ver o resultado final desse cabo de guerra, Gomes estica a corda e tenta sair fortalecido do momento atual, tenta ampliar sua persuasão no seio dos quadros pedetistas e puxar nomes de outros partidos. Se conseguir, sua campanha ganha um certo fôlego e sobreviverá por mais algum tempo. Caso não consiga ela naufraga nesta terça-feira, 09, quando a votação do segundo turno da PEC acontece.

Se o PDT mantiver a posição, Ciro terá que fazer muito malabarismo retórico para explicar a manutenção de sua candidatura, já que Lupi afirmou que ela é irrevogável. Apesar de Gomes ser exímio orador, talvez dessa vez seja mais difícil costurar alguma linha lógica capaz de encontrar sentido. O PDT deu um tiro no próprio pé, Ciro suspendeu a candidatura como uma espécie de curativo. Resta ver se o curativo agiu ou se foi apenas um placebo sem efeito prático.