O sistemático esvaziamento do MEC

Rumo ao quarto titular da pasta, o Ministério da Educação mantém-se marcado por gestões ideológicas e pela negação cotidiana dos problemas reais que afligem a educação brasileira




Colunas, Paulo Junior

Não é necessário ser um grande pensador para compreender a dimensão da educação, para entender a necessidade urgente de que qualquer país a adote como prioridade básica, inegável e inegociável. Educação é abertura e rompimento, é processo fundamental para consolidação de todo ambiente democrático e benfazejo.

No cotidiano, há dúvidas incontestes se o atual governo dispõe de acepção mínima de processo educacional. O que se nota, seguidamente, é um desejo claro de desmonte e desestruturação. Esse desejo vem ganhando cada dia mais corpo e ação na realidade atual.

O hoje é testemunha de uma educação que sofre o seu mais doloroso esvaziamento. Esvaziamento de reflexões árduas e também das mais simples. O hoje demonstra o sonho do esfacelamento do ato do saber, e da construção de novos saberes.

O Ministério da Educação está envolto neste quadro, aliás, ele é o protagonista maior desta situação. O MEC vem sendo esvaziado ano após ano, suas ações tem se pautado por vieses de ideologia barata e de origem altamente contestável. A pasta vem sendo marcada pela negação da lógica, pela exclusão da diferença, pelo pensamento autoritário. O Ministério vem se consolidando como a porta do desamor ao conhecimento, naquele espaço vem ocorrendo a negação do direito a educação.

Em dezoito meses o país está a caminho de portar o quarto ministro de Estado da educação, isso por si só já escancara o descalabro administrativo que a pasta vive, estando permanentemente pautada por acepções de cunho político partidário identitário. Assim, o cotidiano da educação nacional foi, e vem sendo, esquecido, relegado ao segundo plano, quando muito.

A gestão Velez Rodrigues naufragou ainda em abril de 2018, depois uma série de falas mal postas, do objetivo desconhecimento do então ministro dos dados mínimos, e da pífia participação dele em uma audiência na comissão de educação da Câmara Federal. Velez saiu sem deixar saudades, hoje não é lembrado, retornou ao anonimato que marcou, e seguirá marcando, sua vida acadêmica.

Abraham Weintraub seguiu o lastro de seu antecessor, porém, como doses ainda mais generosas de desconhecimento. Weintraub chegou ao governo sob a égide do Olavismo e com um discurso altamente ideológico. Suas falas deixaram evidente o porquê da ocupação do cargo, ele carregava/carrega consigo o mesmo desapreço pelo saber que marca o presidente da República.

Weintraub ficou no cargo mais de um ano, tempo suficiente para produzir uma centena de declarações infelizes, para atacar jornalistas, a democracia, a autonomia universitária. Tempo para descreditar a pandemia, para fundar uma narrativa jocosa de perseguição. Weintraub deixou o MEC depois de atacar o Supremo e acirrar ainda mais os ânimos entre executivo e judiciário, saiu mirando uma vaga no Banco Mundial. Ou seja, ainda é preciso preocupar-se.

Depois de um ano e meio parecia que haveria, finalmente, um ministro para educação, alguém com um pouco de apreço pelo ambiente do conhecimento, do diálogo, da dúvida. Carlos Alberto Decotelli chegou como surpresa, seria ele um quadro técnico, o nome agradou diversos setores sociais, políticos e entidades. Porém, com a surpresa da chegada viu-se o desmanchar de seu currículo, Decotelli havia mentido em quase tudo, era doutor sem defesa de tese, pós-doutor sem reconhecimento da instituição de ensino. Sua dissertação foi acusada de plágio e a FGV (Fundação Getúlio Vargas) afirmou que ele nunca integrou o quadro de professores da instituição. Assim, cinco dias depois de nomeado, foi demitido. A surpresa da chegada não permitiu o ardor da permanência.

Ainda neste seguimento, é necessário realizar um parêntese, Decotelli seria o primeiro negro a integrar o alto escalão do Governo, esse fato também tem um ideal de narrativa visual e ideológica. Nitidamente havia uma ânsia de construir alguma identificação com movimentos e protestos que apontam a dolorosidade costumeira do racismo. Neste quesito, é importante pontuar que o ministro negro teve seu currículo desconstruído rapidamente, mesma incisão não foi direcionada a outros entes, também torpes, da atual gestão federal.

Retornando ao escopo central, salienta-se que rumo ao quarto ministro da educação as perspectivas não são boas. O MEC está sob lógica rasteira e desconstrutora do ideal básico educacional. Caso não se observe a chegada de um nome minimamente técnico, ver-se-á a consolidação dramática do esvaziamento total do Ministério da Educação.

Tudo isso é perigoso, há muito em jogo. O Plano Nacional de Educação divulgou dados oficiais no dia de ontem, 02, e apontou que entre as 20 metas elencadas, apenas uma foi cumprida. Neste interim, indica-se, que esta meta havia sido atingida ainda em 2018, ou seja, há uma estagnação óbvia do processo de alfabetização e desenvolvimento da educação nacional em todos os níveis. Essa estagnação tem reflexo direto com a desorganização histórica que a pasta da educação vive.

Nesse caminho de poucas luzes, ainda há a renovação do Fundeb (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Básica), que está em vias de vencer e carece urgentemente de sequência. A votação do novo Fundeb está programada para ocorrer em cerca de duas semanas, a presença do ministro seria essencial para debater, observar, indicar o que é necessário para que o Fundo cumpra verdadeiramente o seu papel.

Porém, há mais, o Enem ainda não dispõe de data definida, apesar da maioria dos participantes da enquete organizada pelo Inep ter optado por maio de 2021. A definição final só vira depois da confirmação de viabilidade logística e de conversa direta com as unidades da federação. No meio de tudo isso, ainda existem escolas e universidades fechadas, ambientes que buscam meios para conviver com o ensino a distância, para promover acessibilidade e inclusão, para construir protocolos de volta a normalidade.

Enquanto a educação nacional beira o caos, o MEC está vazio. Vazio de reflexão, de olhar, vazio de perspectivas fortuitas de educação e conhecimento. No MEC vem reinando a ilógica, a insensatez e a ausência de compreensão ampla do fazer educacional. O esvaziamento sistemático reproduz os modos operante do Governo, ou seja, a deformação de ambientes básicos e, em tese, incontestáveis. Há caos, crise, marcas de uma gestão federal ideologicamente falha e tecnicamente incompetente.

Como água que corre para todos os lados e banha os que passam a sua frente, o governo não poupa nada, e o MEC, infelizmente, está na linha da rasidão. Que o amanhã traga o sol promulgado no samba de Nelson Cavaquinho, e que seja possível ver a rosa pensada por Drummond. Mas, por hora, o MEC segue seu caminho, vivendo o caos e o esvaziamento. Por essa linha nota-se que o sol ainda está um tanto escondido, e a rosa ainda não furou o asfalto.