O pronunciamento de Bolsonaro atenta contra o povo brasileiro

O pronunciamento de Bolsonaro é um atentado contra a sociedade. Sociedade esta que precisa se proteger. Ele age seguidamente com o aval da irresponsabilidade.




Colunas, Paulo Junior

Quais características definem um grande líder? Bom-senso, perspicácia, proatividade, coerência, inteligência; certamente, estas são algumas indispensáveis. Todavia, o que estabelece a ineficiência de um líder? Não é preciso pensar muito para propor marcas que contrapõem os adjetivos trazidos há pouco. O não-líder se situa em um plano quase que paralelo, distante da realidade, da vida e dos fatos. Ele é produtivo ao produzir incoerências e atentados contra quem deveria liderar.

A crise do coronavírus segue se alastrando pelo país, são mais de dois mil casos confirmados, além de 57 mortes constatadas. A situação é tensa e dramática, exige esforços ativos, rápidos e conjuntos. Não se tratam de ações devaneantes ou irreais, o momento pede que a sociedade fique em casa, se resguarde para achatar a curva de transmissão e não sobrecarregar o sistema de saúde. Essa ação vem sendo adotada pelo mundo inteiro e vem apresentando bons resultados. No Brasil, diversos governadores, incluindo o do Ceará, Camilo Santana, trilharam esse caminho e decretaram quarentena social, suspendendo aulas e fechando o comércio.

Entretanto, o Presidente da República, Jair Bolsonaro, em cadeia nacional de rádio e televisão, na última terça-feira,24, mostrou-se, mais uma vez, deslocado de qualquer contexto de realidade, de vivência. O pronunciamento de Bolsonaro é um atentado contra a sociedade. Sociedade esta que precisa se proteger. Ele age seguidamente com o aval da irresponsabilidade. 

Em seu terceiro discurso público desde que a crise com o coronavírus teve início, o presidente não trouxe nada de novo, não falou sobre um combate altivo, vigoroso e preocupado com o cidadão. Como já virou praxe, minimizou o contexto e criticou as ações dos governadores. Bolsonaro diz estar preocupado com a economia do país, no entanto, para haver economia é necessário que haja pessoas com capacidade física, intelectual e psíquica para circular, trabalhar e consumir. O Presidente da República esquece que este momento exige um novo delinear de prioridades, no agora o ser humano vem em primeiro lugar, sua vida, depois resgata-se a economia.

Existe uma lógica para que crianças, jovens e adultos também estejam em quarentena. Essas pessoas circulam pelos mais vastos locais, trabalho, escola, universidade… e em seguida voltam para casa, local em que teriam contato com todos que integram o grupo de risco, idosos, pessoas com doenças crônicas, entre outros. Acrescenta-se, também, que pessoas fora da faixa de risco podem apresentar casos graves da infecção, ou seja, podem contribuir para colapsar o sistema de saúde, que segue tendo que atender a todos os problemas que já acometem a vida do cidadão brasileiro. É preciso parar um pouco, apenas um pouco. E é necessário que tenhamos um Estado ciente dessa necessidade, da importância de viver este momento de pausa, quanto mais rápido ele for observado, mais rápido deixará de ser necessário.

Bolsonaro, mais uma vez, teceu críticas à imprensa, afirmou que era ela uma das responsáveis pelo exagero, por criar pânico na população. Ele não pondera, não fala que é a imprensa que vem realizando um árduo e extenso trabalho de informação, produzindo materiais didáticos e que vem, sem dúvida nenhuma, construindo um lastro importante de esclarecimento e compreensão de tudo que vem ocorrendo.

O presidente segue em descompasso, desalinhado com o Ministro da Saúde, que entre tantos contratempos vem conseguindo se situar como o adulto da sala. Quando o ministério foi questionado sobre o discurso realizado afirmou, unicamente, que não iria comentar as declarações do presidente, algo inteiramente compreensível. Afinal, diante do que foi dito, não havia o que comentar, havia apenas a perplexidade.

O chefe do executivo paira em uma realidade alternativa e troncha, e ao que tudo indica seguira por este caminho. A repercussão no meio político foi automática, a fala de Bolsonaro foi repelida pelos presidentes da Câmara, do Senado e pela OAB, além de dezenas de governadores, a exemplo de Camilo Santana, chefe do executivo estadual. Houveram, ainda, panelaços espalhados por todo o Brasil, evidenciando, novamente, o descontentamento da população com o método de gestão de crise adotado. Jornais internacionais, como The Guardian, The New York Times e The Washington Post destacaram o jocoso pronunciamento.

Bolsonaro disse que se fosse acometido pelo coronavírus teria, no máximo, uma gripezinha, pois tem histórico de atleta. No mundo deste presidente essa fala cabe em um pronunciamento sobre uma crise de saúde mundial. Isso é assombroso. Bolsonaro está longe de tudo, longe de entender o mínimo, de abstrair a complexidade que o momento exige. Bolsonaro devaneia, vive de teorias absurdas, de frases feitas e de ataques prontos. Diante do coronavírus tudo é mais claro, tudo fica evidente. Bolsonaro apenas ocupa o cargo de presidente, na terça-feira ele provou que jamais conseguirá a alcunha de líder. Alcunha que deve soar com ares de absurdo até mesmo em seus devaneios diários.