Encontraram o Queiroz. E agora?

A prisão conseguida hoje tem capacidade para construir um espaço de alta instabilidade. Queiroz, se resolver delatar, assumirá uma posição de grande impacto, suas declarações são do tipo arrasa quarteirão.




Colunas, Paulo Junior

A manhã desta quinta-feira, 18, foi marcada pelo ressurgimento de Fabrício Queiroz. O ex-assessor de Flávio Bolsonaro não era visto publicamente a cerca de um ano. O caso Queiroz marcou a política nacional nos últimos dois anos, especialmente em 2019. Fabricio Queiroz é acusado de estar envolvido em um suposto esquema de rachadinha no gabinete de Flávio Bolsonaro, quando o parlamentar ainda era deputado estadual pelo Rio de Janeiro. Além disso, o acusado também estaria envolvido em um esquema de funcionários fantasmas.

Queiroz, segundo as informações iniciais, estaria morando a poco mais de um ano em uma casa no interior de São Paulo, em Atibaia. A propriedade tem como dono o atual advogado da família Bolsonaro, Frederick Wassef. Wassef assumiu a defesa da família presidencial ainda em 2018, segundo o próprio advogado ele teria atuado no processo de esclarecimento do atentado sofrido pelo então candidato Jair Bolsonaro, todavia, seu nome não consta na lista de pessoas com acesso ao caso. Recentemente, o advogado tem gozado de trânsito livre nos espaços da presidência da República, do Alvorada ao Planalto. Frederick Wassef torna-se, nesse momento, uma peça importante para o futuro do jogo atual, especialmente porque agora torna-se público seu desejo de ocultar a localização de Queiroz. Em entrevista concedida em setembro de 2019 a jornalista Andrea Sadi, da Globo News, ele afirmou desconhecer o paradeiro do acusado. Afirmação que ocorreu quando o ex-assessor já estava alocado em imóvel de sua propriedade.

Fabricio Queiroz retorna presencialmente ao tabuleiro político, já que o seu fantasma nunca deixou o ambiente nacional. A prisão conseguida hoje tem capacidade para construir um espaço de alta instabilidade. Queiroz, se resolver delatar, assumirá uma posição de grande impacto, suas declarações são do tipo arrasa quarteirão. A declaração de Flávio de que aguarda o desenrolar dos fatos com tranquilidade é mera desfaçatez, é a pose para a cobertura midiática; na realidade, a tensão está em níveis consideráveis. Não existe tranquilidade, existe instabilidade.

A ação foi conduzida pela Polícia Civil e pelo Ministério Público, a motivação para a apreensão preventiva deu-se pela verificação de que o acusado estaria destruindo provas e atrapalhando o desenrolar das atividades investigativas do esquema de rachadinha. Defronte a essa situação, é natural imaginar que ele não atuasse sozinho, há engrenagens densas atrás da imagem Queiroz, das suas ações e do largo tempo de esconderijo. Em meio a tudo isso, recentemente Flávio Bolsonaro elogiou publicamente seu antigo funcionário. Há obscuridades ainda sem luz.

Diante dessas obscuridades é necessário que não se observe tudo com inocência, o ressurgimento do desaparecido procurado, Fabrício Queiroz, não culmina com o esfacelamento do Governo, no entanto e logicamente, o atinge frontalmente. Há muitas camadas nas ações de hoje e nas que virão em seguida. A prisão de Queiroz, ainda, não demoverá Bolsonaro da taxa base de popularidade que ele dispõe, sempre parairando os 25%. Além disso, não irá destituir por completo o restante do apoio no Congresso Nacional.

Os congressistas que emprestam suas imagens a essa gestão têm planos maiores, ou são envoltos em obscurantismo exacerbado, obscurantismo que permanecerá mesmo diante das mais atrozes e revoltantes revelações. Existem muitas dúvidas e perguntas sem resposta, boa parte delas, certamente, poderia contar com uma versão Fabrício Queiroz. Afinal, intimo da família Bolsonaro, ele é conhecedor de anos de desvalorização e precarização da estrutura do Estado, em todos os níveis que o clã atua ou atuou. Mas Queiroz irá falar? Provavelmente menos do que se espera, ele tende a dizer pouco, resta saber o lastro potencial deste pouco a ser dito.

Flávio é altamente próximo do pai, tem envolvimento em boa parte das decisões segmentadas pelo mandatário nacional. Acresce-se a isso o fato de que a incursão da família Queiroz não se limitou ao gabinete de Flavio Bolsonaro no Rio de Janeiro, outros entes ligados ao ex-assessor estavam lotados no gabinete do presidente, quando este era deputado federal.

Há densidades avultantes no ocorrido de hoje, caminha-se para o esclarecimento da ponta do iceberg, especialmente por conta de dados que passam a surgir. Para apontar um dado preponderante, indica-se que em 2016 Queiroz realizou 176 saques, uma média de um a cada dois dias. Apenas no dia 10 de agosto daquele ano foram 5 retiradas, totalizando um montante de R$18.450. O esquema de rachadinha e lavagem de dinheiro irá pautar fortemente o cotidiano do noticiário, respostas importantes podem vir, mesmo que permaneçam na superfície.

O impacto em Brasília ainda precisa ser observado com calma, nitidamente o Presidente não sabe que atitude tomar, hoje cedo não parou para falar com apoiadores, passou silenciosamente em seu comboio rumo ao Palácio do Planalto. Durante o dia reuniu-se com alguns ministros, inclusive o da Justiça, claramente para avaliar a situação e construir uma narrativa. Bolsonaro esteve também com deputados na base aliada, entre ele o Major Vitor Hugo-PSL, líder do governo na Câmara. O Presidente assume neste momento o seu álter ego mais preponderante, assume a posição que mais lhe traz prazer, assume agora o lugar de roteirista barato e sem senso. Nesse lugar ele irá costurar uma justificativa implausível para o sumiço e a prisão de Queiroz, se dirá vítima, se dirá perseguido. O roteiro que ele monta é fraco, há pouca sustentação e, certamente, encontra-se distante da realidade.

Este é um momento para crescimento da oposição, para reposicionamento de suas ações e pensamento de um lastro de futuro. O ressurgimento de Queiroz aponta para muitas possibilidades, há muita dúvida sobre o que será dito e como será dito, em determinada medida pode se construir neste momento o clima para encaminhamento de pedido de impedimento do chefe do executivo nacional.

Entretanto, há máculas, vazios que não serão esclarecidos. O reaparecimento de Queiroz não é a derrocada do Governo Federal, irá atingi-lo e isso é certo, no entanto não se trata da gota final. Ainda haverão muitos fatos, Bolsonaro e família seguirão desgovernando e agindo para se defender. A narrativa bolsonarista ainda não foi publicizada, mas será. Será uma história bufada, gritada, recheada de metáforas de inspiração duvidosa. O ressurgimento de Queiroz movimenta as peças do jogo, mas não é capaz de conduzir sozinha o xeque mate.