Doria, Eduardo Leite e a cisão do PSDB

Vivendo mais um ciclo de crises e rachaduras, o PSDB encontra-se duramente cindido. No contexto atual, a legenda pouco lembra a relevância de tempos passados. Em jantar recente, oferecido por João Doria, escancarou-se a debacle do partido e os desejos ansiosos de alguns nomes. No meio de tudo, Eduardo Leite ganhou espaço.




Colunas, Paulo Junior
Doria e Edurado Leite usam ternos e estão em uma coletiva de imprensa. Eles sorriem.

Aparentemente a regra para a corrida presidencial que se avizinha é a do racha partidário. Na última semana ficou expressa a divisão abissal que marca uma das maiores legendas do país, o PSDB. O jogo político de João Doria para assumir a candidatura da sigla em 2022 parece mais duro, e difícil, do foi outrora programado pelo político.

Na segunda-feira, 08, Doria ofereceu um requintado jantar para a cúpula partidária, o encontro ocorreu no Palácio do Bandeirantes, sede do governo paulista. Certamente o jantar servido tornou-se indigesto. Algumas ausências foram bastante sentidas, em especial a do ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso, FHC é considerado presidente de honra da sigla. Segundo publicado pela Folha de São Paulo, o objetivo era pavimentar o caminho para que Doria assumisse o comando partidário, em um movimento semelhante ao que fora praticado por Aécio Neves e Geraldo Alckmin, quando estes disputaram o Palácio do Planalto.

Entretanto, ocorreu o inesperado e Doria foi posto defronte a ausência de unanimidade para seu nome. Ancorado em figuras que integram a sua gestão, como Wilson Pedroso (Secretário Particular) e Antônio Imbassary (Representante Paulista em Brasília). Além de aliados como o prefeito de São Paulo, Bruno Covas, e o presidente da Assembleia Legislativa de São Paulo, Cauê Macris, o tucano pensou dispor do arcabouço representativo interno necessário. Porém, figuras como Aloysio Nunes (ex-senador) e o atual presidente do partido, Bruno Araújo, deixaram evidentes o descontentamento com o desejo açodado de João Doria por se firmar como presidenciável.

Houve, ainda, o ressurgimento das cinzas de Aécio Neves. O chefe do executivo paulista desejava iniciar uma cruzada pela expulsão do hoje deputado federal. No entanto, foi demovido da ideia por aconselhamento de outros membros do partido. De acordo com eles, provavelmente, Doria sairia derrotado deste movimento, tal qual ocorreu em 2019. Além de trazer Neves aos holofotes, Doria abriu caminho para que Eduardo Leite, governador do Rio Grande do Sul, fosse vislumbrado por muitos tucanos como o nome ideal.

Leite é um político jovem, tem hoje 35 anos de idade, sendo razoavelmente avaliado pelos gaúchos. A comitiva tucana que defende sua campanha já esteve com ele e o indicou iniciar os trâmites para consolidação de seu nome, querem o governador viajando pelo país e movimentando a base do partido. Leite não estava no jantar de Doria e, ao que tudo indica, tratou-se de uma ausência programada.

Reprodução.

O fatídico jantar da segunda-feira, 08, serviu em linhas gerais para desenhar as peças do tabuleiro, definir os que estão ao lado paulista e aqueles que almejam outro nome para o partido. O racha do PSDB não é novidade, a legenda é normalmente envolvida em desentendimentos internos. Todavia, chama atenção a publicidade do momento atual. Tendo saído com apenas 4% dos votos válidos em 2018, o partido precisa se reorientar, pois no quadro atual, terá dificuldade de reviver os tempos de polarização ao lado do PT.

Apesar de contar com algum processo de renovação em suas linhas de frente, o PSDB segue entregando-se frontalmente a alguns movimentos oportunistas. Logo, pouco depois é obrigado a lidar com a conta de tais ações. No caso de Doria, há em sua conta o apoio aberto, declarado e amplo a candidatura Bolsonaro. Portanto, nem mesmo a oposição sistemática que ele deseja fazer é capaz de afasta-lo do passado que ainda é recente e que, sem dúvida, baterá à porta em 2022.

Publicamente rachado, o partido necessita reencontrar caminhos mínimos de uniformidade. Pois caso não o faça, tende a saborear nas próximas eleições gerais um sabor próximo ao da irrelevância. E naturalmente não se espera que uma sigla com o tamanho, e a representatividade que já atingiu, consiga satisfazer-se com o fim da fila e com números de intenção de votos que não atingem a margem de erro.

Doria prepara seus próximos passos e, com certeza, ainda deseja presidir o partido. Buscará por outros meios, tudo para garantir que seu nome seja indicado pela legenda. Caso sinta que não será escolhido, é possível que novos rumos sejam tomados. Afinal, Doria já vive o cotidiano de 2021 pensando nos dias de 2022. Portanto, se o PSDB optar por outro nome, o governador paulista pode desembarcar em siglas como MDB ou, talvez, o futuro partido de Rodrigo Maia. O deputado já afirmou que deve deixar o Democratas.

O que se sabe até agora é que o cardápio do jantar ainda segue em digestão. Pois Bruno Araújo, e toda a diretória partidária, teve o mandato estendido por mais um ano. A decisão foi referendada por todas as diretorias regionais, inclusive a de São Paulo. Bruno Araújo fica no cargo até maio de 2022.

Por ora, os movimentos no tabuleiro voltam a ser sutis, feitos quase que na calada da noite e com certo ar de preparação para algo. Resta ver quem trará a maior surpresa ao fim do prologo, porque os capítulos mais densos dessa história estão prestes a começar.

Vivendo dias de caos, o PSDB tenta redesenhar seu caminho, pois a realidade é que a social democracia expressa em seu título há muito não é vista na prática. Tendo corrido para o campo mais extremo da direita em diversos instantes nos últimos anos, o partido tornou-se vazio e esqueceu de sua própria história. Viver de aparatos oportunistas tem um preço elevado, no caso recente do PSDB, o garçom está começando a trazer a conta, e ao que tudo indica, não será apenas a comida que produzirá indigestão.