A gente cresce e vai esquecendo as paredes da casa. Elas ficam menores e, nós invisíveis diante das paredes da cidade. Quando tinha 14 anos, talvez menos, já escrevia e as pessoas entendiam o que escrevia, mas não sabiam o que eu queria dizer.
Escrever na rua é mais perigoso, principalmente, quando já se sabe o alfabeto e o significado do grito e da surra.
Poderia escrever em casa, preencher papéis com palavras e desenhos e depois guardar, esconder de mim e dos outros, mostrar somente a quem quisesse ver. Essa era a opção descartada apesar de escrever em muitos papéis.
O papel que queria estava nas ruas. Mapeava as ruas e suas paredes, os prédios mais altos e aqueles onde circulavam o maior número de olhos. Saia escrevendo como quem carimba a cidade, onde uma palavra, apenas uma palavra diz o que não se escreve.
Escrevia e voltava para casa, aquela que nunca tive, demorava a dormir, ficava em silêncio, peregrinando nos meus pensamentos e escrevendo percursos da noite e das escritas proibidas. No outro dia acordava cedo para me ver nas paredes das ruas que não eram minhas.
Como eu escrevia, outras escrevem na estátua do Padre Cícero e nas paredes de um banheiro público qualquer. Por pouco tempo a parede fica branca, porque tem sempre alguém querendo dizer algo.