As manifestações de 2 outubro trouxeram uma esquerda clássica para as ruas

Os atos desse fim de semana demonstraram o aparato simbólico de uma esquerda mais clássica, que se fez ausente nos atos de 12 de setembro. Além disso, a pluralidade de partidos e figuras do campo da política mostram um ensaio de unificação.




Colunas, Paulo Junior

O último sábado, 2, marcou a volta das pessoas para às ruas, mais uma vez em atos contra o atual governo, conclamando pelo impeachment de Bolsonaro. Diferente do que se notou em 12 de setembro – quando também houve atos contra o presidente – os desse sábado tinham um pouco mais de vigor e traziam consigo aspectos maiores de unificação em torno de um objetivo comum. No dia 12 de setembro havia faltado esquerda nas ruas, em 2 de outubro esta falta foi um pouco menor.

As manifestações não foram gigantescas, e nem era esperado que fossem, os organizadores sabem das limitações atuais. No entanto, as investidas da oposição nas ruas têm um papel fundamental, que é exatamente o de chamar as pessoas aos atos públicos. Porém, o baixo nível de cobertura vacinal contra Covid-19 certamente é uma dificuldade na construção de atos maiores. Entretanto, é possível esperar que em breve alguns destes atos sejam vistos.

O recado principal está expresso, existe um ar de unificação, ainda que pequeno, entre os vários polos da esquerda nacional, conseguindo atingir alguns nomes do centro. Essa vastidão de bandeiras partidárias e sociais envolvidas em um mesmo evento denota que, ao menos nesta seara, existe a compreensão da necessidade de ações conjuntas. Necessidade de junção de lideranças em torno daquilo que é interpretado como essencial a todos, ou o impeachment de Bolsonaro ou a sua total inabilitação para corrida presidencial de 2022.

Um exemplo objetivo desta amplitude de siglas pode ser notado ao observar a adesão de cerca de 20 partidos aos atos realizados no dia 2 de outubro. Naturalmente que as legendas mais ao campo da esquerda, como PT, PSOL, PCdoB e PSTU estavam presentes, sendo essenciais a concretização dos atos. Todavia, siglas como PSD, PSDB e MDB também estiveram representadas, e surpreendentemente, até mesmo membros do PSL- antigo partido de Bolsonaro- foram vistos pelas ruas.

Objetivamente é preciso pontuar que o impedimento do presidente não sairá para breve, as chances de que isso ocorra são ainda pequenas, já que ele está alinhado aos líderes do Centrão. Entretanto, manter esta pauta viva e gritante nas ruas, e nos corredores do Congresso Nacional, é fundamental para 2022. Bolsonaro está sangrando. De acordo com pesquisa do Poder 360, o presidente tem uma rejeição que atinge 58% da população, e uma (in)gestão pandêmica que depõe integralmente contra seu governo. Além de observar os números da fome e da miséria aumentarem. Segundo dados do Cadastro Único, em maio deste ano 14,5 milhões de famílias brasileiras viviam em extrema pobreza.

Ou seja, o grito nas ruas tem uma função, a de atentar Brasília à impossibilidade de construção de um lastro de apoios à reeleição de Bolsonaro. Este é o grande papel destes atos, dizer não à continuação da barbárie que o país se tornou. As manifestações não precisam ser gigantescas, elas precisam ser coesas ao que desejam influenciar, ter discurso afinado e senso de formação de alianças. Nessa linha, torna-se ainda mais significativa a amplidão de legendas que direta e indiretamente demonstraram apoio às manifestações em destaque. Resta torcer que esse ensaio de unidade de pauta seja capaz de se perpetuar, e ao se perpetuar garantir adequações discursivas dos candidatos do campo da esquerda e centro-esquerda que ruam para 2022.

Em 12 de setembro era nítida a ausência de uma esquerda mais clássica ocupando aquele espaço, em 2 de outubro essa ausência foi menos sentida. O barulho do evento foi maior, os discursos mais inflamados e a adesão mais firme. As manifestações, que aconteceram em mais de 90 cidades, incluindo todas as capitais, são apenas um frame da negação ao bolsonarismo, essa negativa é bem mais ampla. Portanto, logo deve ir às ruas.  

Contudo, há um caso que deve ser notado, o ex-ministro Ciro Gomes (PDT) chegou a sofrer uma tentativa de agressão ao deixar a manifestação em São Paulo. Tais circunstâncias devem ser veementemente repudiadas por todos que estiveram no local. Atos de agressão não devem ser aplicados como método a contraposição de percepções. O debate deve ser realizado no campo democrático e buscando, cotidianamente, o espectro do diálogo. As observações, por vezes, muito acaloradas, do presidenciável do PDT contra o ex-presidente Lula (PT) não podem sair do campo da retórica e serem usadas como justificativa para ações de violência. Isso esvazia o debate, e tudo que não se pode fazer neste momento é esvaziá-lo.